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Fábula: A Balada da Razão e da Loucura

Atualizado: 27 de mar.


"Ele esqueceu o peso da verdade, esqueceu o passado e o futuro, e dançou com ela, livre e insano, até o fim dos tempos." - Ketty Williams
"Ele esqueceu o peso da verdade, esqueceu o passado e o futuro, e dançou com ela, livre e insano, até o fim dos tempos." - Ketty Williams

Havia uma cidade sem nome, oculta entre montanhas eternas e sombras que se moviam como sonhos inquietos. No coração dela, viviam dois irmãos gêmeos—o Intelecto e a Loucura. Eram idênticos no rosto, mas opostos na essência: enquanto o Intelecto caminhava com os olhos cheios de lógica e precisão, a Loucura dançava descalça, rindo de tudo que ele levava a sério.


Certo dia, um Rei perturbado pelos próprios pensamentos convocou-os. Ele sofria de uma maldição: sua mente era um labirinto de dúvidas, onde nenhuma certeza era permanente. O Rei pediu que um dos irmãos o curasse.


— Se escolher a mim, Intelecto, darei a você a clareza absoluta. Nunca mais temerá o erro, pois conhecerá todas as verdades.


— Se escolher a mim, Loucura, libertarei sua alma. Nunca mais será atormentado pelo peso do conhecimento, pois nada o prenderá à necessidade de entender.


O Rei hesitou. Escolher o Intelecto significava ser escravo da verdade—e a verdade nem sempre era bela. Escolher a Loucura significava libertação, mas à custa da sanidade.


Ele finalmente falou:


— Quero a verdade. Quero o Intelecto.


O Intelecto sorriu e tocou sua testa. Naquele instante, a mente do Rei expandiu-se, e ele viu tudo. Ele viu as mentiras escondidas em seus conselheiros, os segredos de seus súditos, as traições futuras, os erros passados. Ele compreendeu que seu próprio reino fora construído sobre sangue e ilusão. A verdade queimou sua alma como uma lâmina de gelo.


Desesperado, o Rei gritou:


— Loucura! Me liberte disso!


A Loucura riu e o abraçou. E, no abraço dela, o conhecimento se desfez como neblina ao amanhecer. Ele esqueceu o peso da verdade, esqueceu o passado e o futuro, e dançou com ela, livre e insano, até o fim dos tempos.


No trono vazio, o Intelecto observou. Ele sabia que seria chamado novamente.


Pois a humanidade sempre oscila entre a lucidez e a loucura, sem jamais pertencer inteiramente a nenhuma delas.

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